
Talvez o mais admirável da franquia Harry Potter seja a capacidade de lançar tantos filmes sem saturar aquele universo, graças a constante troca de diretores que acabam sempre reinventando a fórmula que deu sucesso ao bruxinho nas telas (ainda que a essência seja conservada). Se os primeiros filmes serviram para introduzir o mundo mágico de forma leve e infantil (Pedra Filosofal e Câmara Secreta), Ordem da Fênix tráz um clima sombrio e melancólico, que introduz Harry a um mundo cheio de incertezas e medos, totalmente diferente daquele ao qual nos acostumamos.
Isso é perceptível logo no início, quando acompanhamos um ataque de dementadores. A fotografia está notavelmente diferente (acredito que até os mais distraídos perceberão de cara a óbvia mudança), que apela ainda mais pra cores frias (lembram-se do radiante sol que iluminava Hogwarts em A Pedra filosofal durante quase toda projeção?), além da mudança clara no tom da narrativa. Alias, A Ordem de Fênix conta com um interessantíssimo conflito político, protagonizado pela "guerra" entre Harry e Dolores Umbridge, encarnada por Imelda Staunton com admirável competência. Alêm dela, a novata Evanna Lynch vive Luna de forma brilhante, sendo um dos pontos mais interessantes do longa (as cenas de diálogo entre Harry e Luna estão entre os melhores momentos do filme). Novidade no elenco, é ainda Helena Bonham Carter, na pele da maléfica Bellatrix Lestrange (e com jeito de psicótica que daria medo nas bruxas da Walt Disney), uma comensal da morte que acabou não aparecendo tanto quanto merecia, mas que com certeza terá uma participação melhor em O Enígma do Príncipe.

Com uma direção de arte espetacular e efeitos especiais acima da média, Harry Potter e A Ordem da Fênix consegue criar sequencias fascinantes, como duas belas cenas de vôo, o famoso "momento Weasleys" (os que leram o livro sabem do que estou falando) e a fantástica cena climax, no departamento de mistérios (todo o ministério de magia ficou simplesmente fascinante). Vale notar também, que o combate entre dois personagens no final é digno de aplausos, pela criatividade e eficácia dos efeitos especiais, na qual vemos um duelo de bruxos que demonstra o que se pode fazer com varinhas (coisa que até então, só ficava na nossa imaginação). Mas o momento principal do filme são mesmo aqueles da Armada de Dumbledore, comandada por Harry, em que vemos um grupo de alunos aprendendo a usar magias para se defender da ameaça que os acerca.
Com um rítmo muito mais lento que o antecessor Cálice de Fogo, é bem provável que o excesso de diálogos deixe o público mais jóvem entendiado. O fato é que, apesar de momentos engraçados aqui alí, Ordem de Fênix mostra-se claramente ao drama como objetivo maior. No livro, haviam inúmeros momentos mais leves que foram cortados (a principal reclamação dos fãs com certeza diz respeito ao quadribol) mas, considerando que este é de longe o maior livro da série, não dá pra negar que um ótimo trabalho foi feito na edição, considerando os acontecimentos de maior importância, e com mais louvor ainda, criando alguns momentos que não só soam totalmente fiéis, como acrescentam consideravelmente o desenvolvimento dos personagens (bem como a interação entre eles). Talvez minha única grande reclamação fique por conta do importante (não só do ponto de vista de informações da história, como também dramático) diálogo final entre Harry e Dumbledore. Resumido de forma pobre, é uma cena que com certeza merecia alguns minutinhos investidos, por ser um dos momentos mais belos do livro (e meu descontentamento aumentou ao perceber que essa cena era fundamental para percebermos que Harry ficou deprimido com a perda que não pretendo revelar aqui, e o destino que ele precisará carregar nas costas).

Queria ainda, elogiar Nicholas Cooper, compositor da trilha sonora deste episódio, que conseguiu criar faixas em sua maioria novas, belas e menos repetitivas que as do brilhante John Williams (embora sua trilha não tenha ficado tão boa quanto à de Patrick Doyle em Cálice de Fogo). No mais, o que posso dizer é que o novato David Yates realizou um majestroso trabalho, resultando no melhor blockbuster do ano até agora. Não dá pra dizer qual é o melhor Harry Potter produzido, já que são bastante diferentes e todos acrescentam algo novo para a série (se não fosse Cuaron com seu Prisioneiro de Azkaban, tenho certeza que a franquia tomaria um caminho totalmente diferente), mas o que posso dizer com absoluta convicção é: com esse amadurecimento do mundo e dos personagens, A Ordem da Fênix é o episódio que abandonou de vez o conceito filme-pipoca divertido, e colocou a série como um filme de fantasia que merece ser respeitado nas próximas gerações. E com este resultado tão promissor, digo que terei orgulho de apresentar esse universo mágico aos meus filhos no futuro.